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ernesto sabato

O homem, a alma do homem, está suspensa entre o anseio do Bem, essa eterna nostalgia que temos do amor, e a inclinação para o Mal, que nos seduz e possui, muitas vezes sem que tenhamos sequer compreendido o sofrimentos que os nossos actos podem ter provocados nos outros.
A bondade e a maldade não são possíveis de abarcar, porque acontecem no nosso próprio coração. São, indubitavelmente, o grande mistério. Esta trágica dualidade reflecte-se na cara do homem, onde lenta mas inexoravelmente, deixam a sua marca os sentimentos e as paixões, os afectos e os rancores, a fé, a ilusão e os desencantos, as mortes que vivemos ou pressentimos, os Outonos que nos entristeceram ou desanimaram, os amores que nos enfeitiçaram, os fantasmas que, nos seus sonhos ou nas suas ficções, nos visitam ou acossam. Nos olhos que choram de dor, ou se fecham de sono mas também por pudor ou por astúcia, nos lábios que se apertam por obstinação mas também por crueldade, nas sobrancelhas que se contraem por inquietação ou estranheza, ou que se levantam na interrogação e na dúvida, enfim, nas veias que incham de raiva ou de sensualidade, se vai delineando a instável geografia que a alma acaba por construir sobre a subtil e maleável pele do rosto. Revelando-se assim, segundo a fatalidade que lhe é própria, através dessa matéria que é simultaneamente a sua prisão e a sua grande possibilidade de existência.
(Resistir)

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